Tocam as Sirenes
a lembrar o Tempo de voltar para Casa
António Justo
Na natureza nada é tão mau que
não seja também para algo bom. Isto segreda-nos a voz da natureza através da
razão num momento em que os nossos sentimentos ao rubro bradam aos céus.
Fizemos da ilusão realidade e
agora a realidade natural ou criada desilude-nos porque nos julgamos ou
julgávamos ser senhores dela. Um facto é que se não fosse a morte estaríamos
condenados a viver na e da ilusão.
Vivemos numa pausa obrigatória em
que o homem respira pior e a natureza respira melhor. Os rios são mais claros,
o ar mais puro, nós temos mais tempo porque o relógio deixou de ter poder sobre
nós.
É tempo de voltarmos para casa e
resta saber o que fazer com o tempo. Agora temos a oportunidade de ouvir e
sentir a revelação da natureza e a revelação cultural que se encontra
especialmente explicita no Novo Testamento. Nele encontramos sentido, força, esperança,
consolo e reconhecimento.
À Semana Santa segue-se a Páscoa. Com a ressurreição
a morte perdeu e o mundo ganhou sentido ficando virado de cabeça para baixo.
O respeito pelo coronavírus, o
medo pelo nosso futuro económico e social, as informações e contra informações
e as infrações, possivelmente justificadas na nossa democracia pelo decreto do
estado de emergência, criam em nós um sentimento de insegurança e de impotência.
Chegou o tempo de estarmos alerta
e é tempo da sintonia e não de imagens inimigas estimuladas ou propagadas. É
chegado o tempo de nos unirmos e de juntarmos forças, na consciência que todos
fazemos falta para alguém. É verdade que não será fácil, na vontade de sermos
solidários com alguém, não sermos levados na avalanche de algum tipo de vírus
que circula. A falta
de humildade leva-nos a ordenar rigidamente as coisas e até a condenar sem termos
tempo para socorrer-nos do discernimento.
Agora, que ouvimos também toda a
natureza a sofrer, sofremos por ela sofrer e sentimo-nos mais chamados a
levarmos um estilo de vida mais humilde e em sintonia com todos em vez de
corrermos atrás de possíveis culpados ou de explicações que levam a nossa mente
a marcar passo para não nos mudarmos e assim continuarmos a ser levados na
corrente de hábitos adquiridos ou difundidos. Num tempo propício para
prepararmos mudança seria fatal ficarmos fixados em nós mesmos, numa maneira estática
de ver e de pensar.
De facto, num tempo em que a reflexão,
a solidariedade e a ciência nos devem iluminar não fazem sentido meros discursos
políticos ou de perspetiva individual: o Homem no seu ser de pessoa é que é o
centro da questão.
Em tempos de crise, tudo vem à
mente e não será também de esquecer a frase que Nicolau Maquiavel escreveu: “Mas
a ambição do homem é tão grande que, para satisfazer uma vontade presente, não
pensa no mal que daí a algum tempo pode resultar dela. “
António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e Pedagogo
In Pegadas do Tempo, https://antonio-justo.eu/?p=5814
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