MORAL SECULAR E
MORAL CRISTÃ EM DIÁLOGO
Moralidade
é a resposta a nível de conduta a princípios, valores e regras de comportamento
que orientam o ser humano para o bom viver em sociedade no sentido de alcançar
a felicidade...
A ética (filosofia moral) serve-se das
diferentes concepções de moralidade para buscar princípios universais que orientem
o comportamento humano, no âmbito do certo e do errado e procura estabelecer
padrões e princípios de comportamento do bom viver para todas as pessoas.
A moral
é mais pessoal e culturalmente
circunstanciada, estabelecendo o seu comportamento no âmbito do bem e do mal...
A moral secular situa-se fora das
tradições religiosas embora integre delas muitos valores secularizados que em
vez de assumirem uma relação com Deus buscam a fonte da sua orientação
comportamental na razão, na ciência e na legislação estatal...
A moral cristã baseia os princípios
éticos que orientam o comportamento humano em Deus, na tradição, na razão e no
agir de Jesus Cristo. As normas morais cristãs, pelo facto de estarem sujeitas
à consciência pessoal de cada um não contradizem o caracter universal da moral
apesar do código formal que as envolve (no cristianismo a consciência
individual é a soberana). Parte de um só Deus como elo comum de toda a
humanidade e em que todo o humano tem a mesma dignidade inviolável baseada na
filiação divina independentemente de crença ou descrença....
Enquanto a moral secular acentua o falar
de valores, a moral cristã acentua a virtude (atitudes humanas), isto é, valores
aplicados...
A ética (filosofia moral) serve-se das
diferentes concepções a respeito da moralidade para buscar princípios
universais que governem o comportamento humano, no âmbito do certo e do errado
e procura estabelecer padrões e princípios de comportamento do bom viver para
todas as pessoas...
A ética secular geralmente orienta a
moralidade pelas consequências das acções praticadas tendo em vista o caracter
utilitário delas. O padrão de orientação para a moral correcta verifica-se nas consequências positivas para a maioria
das pessoas....
A
flexibilidade da moral cristã revela-se no respeito pela consciência individual
considerada soberana e pela presença do Espírito Santo como forma de expressar
a revelação de Deus a nível individual e no processo histórico...
As desvantagens visíveis na moral
secular devem-se sobretudo à precaridade das suas fundamentações a nível de
fontes e de autoridade e a não considerarem a pessoa integral pois deixam fora
do seu âmbito questões
espirituais e existenciais profundas ...
A
flexibilidade da moral secular pressupõe como consequência o relativismo moral
que conduz à atitude de cada cabeça sua sentença e ao possível descrédito de
tudo o que é institucional possibilitando um estado cultural confuso e caótico
que só viria a servir a institucionalização de um poder autoritário global
anónimo preocupado apenas em seguir o espírito do tempo ou em determiná-lo. Por
outra parte, em termos sociais, a moral cristã, na sua tendência para se fixar sobretudo na tradição, revela
uma certa inflexibilidade perante as mudanças sociais dando a impressão de
chegar atrasada na história. A sociedade, porém, precisa de instituições
alternativas estáveis não só viradas para o presente e deste modo temperem o
encanto do novo e do provisório de modo a garantir mais responsabilidade humana
e histórica no desenvolvimento humano...
Crenças,
valores e contextos individuais e culturais entremeiam-se de maneira a pessoas
integrarem elementos de ambos os sistemas no comportamento do seu dia a dia e
na própria compreensão da sua moralidade.
A
substituição da moral pelas leis tornar-se-ia incongruente porque o direito não
tem por natureza algo imanente que o fundamente...
Limitar
a consciência às necessidades primárias é deixá-la à mercê dos ventos sem saber
para onde nos levam e facilitar a organização de poderes hegemónicos e
formatadores de consciência de caracter oportuno e anónimo...
Como as pessoas imigradas traziam
consigo a sua cultura religiosa específica como forma de identificação, surgem
na sociedade europeia morais religiosas diferentes, lado a lado...
Assim surgem tentativas a nível
religioso e não religioso de apresentar valores consensuais de referência com
validade para uma sociedade querida multicultural e diversa...
Hans Küng criou a Fundação Ética Mundial
(Global Ethic Foundation) que defende valores básicos comuns em todo o mundo,
baseados em pontos análogos já existentes nas diferentes religiões...
(Atendendo ao caracter meramente
funcional da pessoa no islão, ele é beneficiado pelo socialismo, no discurso
público) ...
Um Estado de caracter globalista e
secular orientado pela economia e pelo comércio está interessado em fomentar
uma ética secular não baseada na crença em Deus nem na religião e substituir
para isso a religião pela ciência e Deus pela razão e o humanismo por um
utilitarismo mecanicista...
A razão
procura fundamentar valores como dignidade humana, respeito, justiça, compaixão e empatia,
baseando-se no direito abstrato de que todas as pessoas são iguais com iguais
chances e direitos perante a lei (de notar que já aqui o direito/lei natural
contradiz o direito positivo!)...
A ética cristã é de caracter
relacional pessoal (centrada no antropológico) de conotação metafísica e a
ética secular é de caracter funcional individual abstrato (centrada no
sociológico) de conotação materialista (sendo o valor da pessoa concebido em função
do colectivo) ...
Nesta perspectiva apologética, tanto a espiritualidade cristã como o
idealismo secular fundamentar-se-iam igualmente no medo: no medo do castigo no
além ou no medo de castigo no aquém. Os princípios éticos não podem ser reduzidos nem à religião nem à
ideologia política, podendo-se, contudo, expressar em diferentes morais e
costumes!...
Na moral cristã o soberano é
o indivíduo e na moral secular o soberano é o colectivo...
A ideia da moral secular de
que atitudes éticas constituem elas mesmas a própria recompensa não tem em
conta a natureza humana e carece de sentido que vá além das necessidades
individuais e sociais (e como tais limitadas a um tipo de sistema ou
regime político-social controlador). O ser humano passa a ser o fim de e em si mesmo, o que contradiz o
desenvolvimento aberto da natureza, pois em toda ela se constata que há um
sentido e este se processa de baixo para cima...
Os arquitetos de uma nova
sociedade tentam criar uma supraestrutura comum, mas confrontam-se com uma sociedade
multicultural com fronteiras culturais e religiosas e com diferentes medidas do
que é certo e do que é errado (veja-se cristianismo, islão e materialismo) ...
A pessoa é mais que a sua
convicção ou mundivisão e por isso não pode ser avaliada pela sua simples
convicção nem pela sua função social...
A ideia da globalização e da
moral secular não pode passar por cima dos diferentes biótopos culturais nas
suas diferentes maneiras de ser, estar, pensar, sentir e agir (a liberdade que
pretende para a pessoa deve possibilitá-la aos biótopos culturais)!...
O fomento da autonomia e da
livre vontade, que a moral secular (contraditoriamente) quer ver como
propriedade sua, esquece que a pessoa mesmo “autónoma” se define também pelo
outro (um tu) e se encontra integrada num meio social e cultural...
Pouco a pouco o Estado foi
assumindo ao longo da História o caracter humanitário do cristianismo...
Dignidade humana, autonomia
e comunidade são factores complementares que não se podem colocar uns contra os
outros, tal como não se deve afirmar o Estado à custa da religião nem a
religião à custa do Estado; a realidade social em que nos encontramos obriga
uns e outros a atuarem numa atitude de subsidiariedade e de complementaridade
sem se combaterem para assi se iniciar uma cultura de paz...
O razoável mais natural é
afirmar a diversidade dos biótopos culturais que na sua realização contribuem
para um melhor espelho da felicidade da sociedade e do globo (na natureza e sua paisagem
temos um sobreiral ao lado de um pinhal e de um eucaliptal sem que um espaço
tenha de negar o outro nem de excluir outros!) ...
Querer fazer derivar o
respeito e o reconhecimento da dignidade humana da justiça social seria cair
num círculo vicioso dado a justiça partir da dignidade e do respeito...
A substituição da divindade pela ciência, como pretende a moral secular,
também não é consistente dado a própria ciência estar sujeita a mudanças e à
confirmação de hipóteses. A moral profana pressupõe o Estado
e este revela-se de caracter frágil no decorrer do tempo. Os laços de solidariedade e de justiça social são insuficientes para
vincular uma consciência, deixando-a presa ao direito positivo variável, e como
tal manca no que respeita à motivação e ao compromisso com a justiça e a
solidariedade...
A autoridade moral não pode ser
preceituada e pretender baseá-la em estatísticas seria algo aleatório...
Observa-se que uma sociedade ao tornar-se multicultural, para se justificar
e autoafirmar inclui nela a luta contra a tradição da maioria e contra a
tradição servindo-se para isso de um liberalismo maléfico que conduz ao
individualismo deserdado.... uma vez perdida a herança cultural perde-se também
a sociedade/povo que, na consequência, passaria a ter uma expressão meramente
individualizada, caótica e autoritária...
No experimento de um mundo a tornar-se
multipolar, tanto as morais religiosas como as morais seculares terão de
empreender uma relação de convívio harmonioso na consciência de que são membros
ou especificidades dinâmicas de um só corpo...
Nesse sentido seria de se
integrar a nível individual e social o Princípio Jesuíno: a Deus o que é de
Deus e ao Estado o que é do Estado salvaguardando a soberania da consciência de
cada pessoa sem que esta pretenda exercer a soberania sobre o outro. Pressupõe-se, para isso, o reconhecimento recíproco na base do diálogo e do
compromisso, na certeza, porém de que a resposta dada pelo cristianismo como modelo
abrangente para toda a humanidade tem um caracter de matriz a não perder...
É por isso que a civilização
ocidental, sem renunciar ao que foi alcançado, deve reconhecer o pai e a mãe da
sua cultura: o judaico-cristão como mãe e o greco-romano como pai.
António da Cunha Duarte Justo
Teólogo e Pedagogo
Texto completo em Pegadas do Tempo: https://antonio-justo.eu/?p=9220